terça-feira, 18 de dezembro de 2007

O RJIES começa a fazer estragos

O RJIES já está nas notícias pela instabilidade que tem criado entre as universidades. No Instituto Superior Técnico o Presidente viu rejeitada pelo Conselho Científico a sua proposta de criação de uma assembleia ad-hoc para a criação de uma fundação de direito privado. Pouco tempo depois a lista do sector neoliberal foi derrotada na eleição para a Assembleia Estatutária da Universidade Técnica. O presidente do IST quer agora que a escola aprove uma moção de confiança para continuar no cargo.



Entretanto foram surgindo na imprensa rumores sobre o projecto de passagem a fundação de direito privado da Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa. O projecto prevê um consórcio com o Hospital de Santa Maria, o Instituto de Medicina Molecular e um grupo empresarial da área da saúde. Fala-se nos grupos Mello e Espírito Santo.
Estas notícias vão certamente repetir-se num futuro próximo e quase invariavelmente envolvendo as faculdades mais apetecíveis para os interesses económicos como as de medicina ou engenharia.

Estas movimentações, são apenas o início de um processo conturbado aberto com a aprovação do novo Regime Jurídico das Instituições de Ensino Superior. O RJIES é a expressão portuguesa de um projecto de modernização neoliberal das universidades europeias. O seu objectivo é competir com o sistema de ensino superior dos Estados Unidos da América mimetizando a sua organização, nomeadamente a existência de um pequeno grupo de universidades de elite, capazes de atrair abundantes investimentos privados que lhes garantam uma vantagem na oferta de ensino de qualidade e investigação de nível internacional. Para as grandes empresas a perspectiva de se apoderarem dos resultados da investigação é obviamente uma oportunidade a não perder, pelo que em alguns sectores da economia não faltarão candidatos com vontade de comprar uma faculdade.

Nenhuma universidade portuguesa tem no seu conjunto o potencial para cativar os interesses privados (portugueses ou estrangeiros). Basta pensar nas faculdades de Letras que por natureza se dedicam ao estudo de matérias pouco rentáveis. No entanto uma das possibilidades abertas com o RJIES é a de faculdades ou outras unidades orgânicas se separarem das universidades a que pertencem actualmente e formarem por si só uma nova instituição, juntarem-se a outras instituições de ensino superior ou estabelecerem consórcios com empresas privadas. Cria-se assim um mecanismo de competição que pode levar a que as instituições com maior capacidade de atrair dinheiro privado se juntem em detrimento de faculdades menos competitivas.

É provável que por enquanto reitores e presidentes de conselhos directivos prestem juramentos de fidelidade às suas instituições, enquanto analisam as movimentações da concorrência. Mas assim que a primeira faculdade der o passo da privatização muitas outras se seguirão. Para os mais reticentes em abraçar o projecto neoliberal de "abertura à sociedade", o Ministério da Ciência e do Ensino Superior terá sempre de reserva a arma da asfixia financeira.

Rui Borges

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