terça-feira, 5 de junho de 2007

Regime ‘Fatídico’ para as Instituições do Ensino Superior?




No final de um ano lectivo, quando começam os exames e acabam as aulas, quando os estudantes estudam e têm menor capacidade de mobilização chegam as respostas a algumas perguntas que já vinham a ser anunciadas há algum tempo sob a forma de um novo Regime Jurídico das Instituições de Ensino Superior (RJIES). Vale a pena mais uma vez reparar no timing em que estes documnetos são revelados, mesmo em cima da época de exames, mesmo no final do ano, durante as férias, não é esta a primeira vez, basta ter um pouco de memória para reparar que a estratégia usada é quase sempre a mesma, lançar as leis nas férias, decidir de Escola vazia para que os estudantes não estrebuchem muito..


Sendo este um texto de análise deste novo RJIES comecemos pelo início, pela definição, este conjunto de leis vem regular as instituições do Ensino Superior nomeadamente a sua constituição, atribuições, e organização, o funcionamento e competência dos seus órgãos e, ainda, a tutela e fiscalização pública do Estado sobre as mesmas. E não é preciso ler muito dele para vermos o que começa a cheirar mal, logo no artigo 2º (na primeira página) lemos o que é a missão do ensino superior para estas pessoas, que em três pontos se define com o objectivo de qualificar de alto nível os portugueses e portuguesas, assegurar as condições para que todos os cidadãos possam ter acesso ao ensino superior e estimular a mobilidade dos estudantes e diplomados. Discurso um pouco contraditório com o que se tem visto com Bolonha, os cursos passaram a ser de menor duração, e o segundo ciclo será para todos? E não há uma palavra acerca da preocupação social que estas instituições devem ter, nem acerca do incentivo à participação democrática no conhecimento, pois ao longo do documento vê-se que esse não é um objectivo, o que se quer é uma Universidade que seja uma boa ‘máquina de fazer chouriços’ com o âmbito único da empregabilidade.



Páginas à frente, não muitas, está um artigo 9º que define o seguinte: As instituições de Ensino Superior públicas são pessoas colectivas de direito público, podendo porém revestir também a forma de fundação pública de direito privado, nos termos previstos no capítulo V do título III. Acho que a frase fala por si, e já não há vergonha em admiti-lo por parte de quem fez esta lei, o caminho que se quer seguir é o da privatização. A rede de Escolas criada no país durante todos estes anos através de dinheiro público, ou seja de todos os portugueses, que confiam num sistema público de Ensino que favorece a educação de toda a gente sem preconceito pode mudar de um dia para o outro para um sistema privado, que terá preocupações bem diferentes de um sistema público como sabemos. E hoje em dia estamos recheados de bons exemplos, basta ligar a TV ou ler um jornal. Se se consultar o tal capítulo V que regula a Criação da fundação, o artigo 1 define que esta fundação pode ser criada mediante a proposta de apenas uma pessoa, o reitor ou presidente, aprovada pelo conselho geral, por maioria absoluta dos seus membros. O presidente decide, e os estudantes, como verão à frente não podem ganhar contra uma maioria absoluta.


Esta possibilidade de acesso de toda a gente ao Ensino Superior é posta em causa umas páginas mais adiante, no artigo 20º, no ponto 7. Depois de dizer no ponto 2 que a acção social garante que nenhum estudante é excluído do subsistema do Ensino Superior por incapacidade financeira, o que como princípio não podia estar mais correcto, este 7 confirma mais uma vez a falta de vergonha e o caminho assumido por este documento. Afirma que o Estado promove a disponibilização de empréstimos aos estudantes. Aqui o Estado formula o príncipio mas depois demiti-se da sua capacidade para o executar lançando os estudantes na concorrência bancária que tanto quer bem aos futuros empregados e futuros devedores.. Não vamos incentivar as bolsas. Depois de acabado o curso, pagas o que andaste a fazer, e pagas também o empréstimo da casa, e do carro, e do recheio da casa, e ainda és capaz de ter algum dinheiro para comer e... viver. A precariedade é para começar na Universidade.(Precariedade rima com Universidade)


Gostava de ficar por aqui e não continuar a ler, mas ao virar a página vejo a alínea f) do Artigo 25º em que o Estado se compromete a assegurar a participação dos estudantes, professores e investigadores na gestão dos estabelecimentos, esqueceram-se dos funcionários não foi? Mas vamos ver como isto se faz. Na composição do conselho geral que tem membros dos professores e investigadores, assim como dos estudantes, não se voltam a ver funcionários... foram substituídos por personalidades de mérito reconhecido não pertencentes à instituição, eleitos pelos membros anteriores por maioria de dois terços. Mais à frente vêm os pontos que definem os membros que compõem este conselho, mais de 50% de professores e investigadores e, pelo menos 30% de personalidades, de mérito, o que deixa os estudantes com menos de 20% de representação, e sendo que estes conselhos terão entre 10 a 25 membros vemo-nos reduzidos a 1 representante.. Menos representação, menos possibilidade de vermos reconhecidos os nossos direitos, menos possibilidade de ideias diferentes circularem, menos democracia, mais controlo. E é chocante e sem vergonha, mais uma vez, eliminarem os funcionários das decisões..



Chega!! Assim não vamos lá, não se pode assistir de forma pacata a um atropelar seguido de tantos direitos de um Ensino Superior de qualidade. Como definido na RGA de 29 de Maio exigimos que enquanto estes pontos não forem retirados do documento revogaremos toda esta nova lei que está em discussão, e admitimos ainda uma discussão artigo a artigo deste RJIES.


Esta moção foi aprovada por unanimidade de tod@s @s estudantes presentes.

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